quarta-feira, 30 de maio de 2012

Manchete falsa: Política Pública e Xuxa


Se um aluno de redação, no ensino fundamental, cometesse um erro desse tipo, que nota teria?
A chamada, em primeira página do site UOL    (Denúncias a violação de direitos crescem 30% com campanha do governo e depoimento de Xuxa) , diz que o aumento das chamadas teria como causa o depoimento prestado por Xuxa, em programa dominical da rede Globo.
O texto, porém, desmente tal fato, ao dizer que o aumento estaria relacionado a outras causas.
Triste a imprensa que faz isso, como meio de obter leitores, desinformando.
Se você setá apressad/ao ou não gosta de ler e se contenta com a manchete... pronto, vai debater até a norte por uma causa inexistente.
Digo isso para que fique claro que os males passados de alguém nao se redimem com depoimento de vítima. Não que o depoimento não seja importante, porque é e muito, numa sociedade que vive a violência a tal ponto que passa a considerá-la normal, coisa do destino. Extremamente importante, quando as vítimas são as crianças, jovens, adolescentes, dentro e fora de suas casas, que deveriam ser abrigo e não lugar de abusos e medo, cabendo a todos e também ao Estado preservar a vida e a dignidade dessas crianças, jovens e adolescentes.
Digo isso contra as autoridades que desejam ganhar seu bocadinho de fama e votos em cima do depoimento de apresentadora de programas infantis.
Programas que sempre foram nocivos - existe até tese sobre isso - que vendiam produtos, sem qualquer etica, buscando fazer de criancas consumidroes precoces. Houve até ação judicial a respeito de um tênis, se nao me falha a memória. Programas que vendiam a sexualização precoce, aliás.
Artistas sâo apenas artistas e, no mais, pessoas idênticas a todas as outras, com eros e acertos.
A Secretaria aparece e quer usar a imagem, apropriar-se dela, como se política pública pudesse ser substituída por caso ou depoimento fortuitos, assim como havia feito em episódio lamentável do lamentável BBB.
Os congressistas aparecem e querem convocar para o mesmo depoimento feito em horário de alta audiência, em domingo.
O que eles querem: que o/a artista cumpra o papel do Estado, que sensibilize as autoriddes que são eles mesmos?
Que indique o número de telefone?
Que diga que fazer o mal é mal e que as pessoas devem denunciar?
Para tudo isso, mais educação e menos propagandas de artistas, cuja vida é a aparência e o que rende a aparência.
Temos, por outro lado, gente de valor entre os artistas, assim como há gente de valor, no meio da multidão.
Podemos valorizar uns e outros, sem que nos tornemos dependentes da publicidade e do que se publica.
A autonomia traz a verdadeira segurança para reagir ao ato de violência, para proteger contra quem a exerce, para denunciar e cobrar e fiscalizar pela tomada de providências sérias e para a proteção adequada.

Recomendo também  a leitura de Marcelo Stycer: depoimento de xuxa transforma espectador em psicologo

sábado, 19 de maio de 2012

Ditadura, democracia e verdade



Carta Maior DEBATE ABERTO 
Qual é a pauta da luta pela verdade sobre a ditadura?
por Edson Teles Professor de Filosofia Política na Universidade Federal de São Paulo Unifesp

"A discussão a ser pautada pelos movimentos sociais, não é exclusivamente sobre o mérito dos membros da Comissão Nacional da Verdade, mas sobre quais as perguntas que tal comissão fará em seu funcionamento e quais respostas ela dará aos anseios de uma democracia por vir.
Data: 16/05/2012
No último dia 10 de maio, após cerca de seis meses de sua aprovação no Congresso, finalmente a Presidente Dilma Roussef nomeou os sete membros da Comissão Nacional da Verdade. De acordo com a Lei que institui a Comissão, estes conselheiros terão por tarefa “efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”, examinando e esclarecendo “as graves violações de direitos humanos praticadas” no período entre 1946 e 1988. Dois movimentos, por vezes contraditórios e em outros momentos confluentes, se evidenciam sob o foco deste acontecimento.
O primeiro ocorre sob o impacto da nomeação na grande mídia e se refere à qualidade dos sete indicados. Assim, uma maioria de opiniões elogiou os nomes designados, ora ponderando sobre o histórico de boa parte, ora enaltecendo a ausência de representantes do “outro lado”. De certo modo, a pauta da grande mídia em torno dos nomes mostra a ação do Estado brasileiro, em especial do Executivo, em seu esforço de governo para alcançar uma composição com o máximo consenso político possível.
Este primeiro percurso nos permite refletir sobre duas lógicas da estrutura do Estado Democrático de Direito que, no Brasil, se instalam especialmente a partir da Constituição de 1988. Por um lado a que consiste na oposição entre o legal e o ilegal por meio da criação das leis e da punição ao ilícito. Esta divisão entre o permitido e o proibido é tão antiga quanto o Estado Moderno, porém com sua legitimidade deteriorada diante de regimes autoritários, como foi o caso da ditadura militar, ganha nova relevância com a democratização. Os estados de direito se organizam justamente sobre a normatização das práticas sociais e, deste modo, instituem os direitos, as leis e regulam as sociabilidades por meio do ordenamento jurídico.
Uma segunda lógica das democracias contemporâneas é a do governo. Nelas há toda uma série de relações de forças em conflito que não podem ser reguladas pelo direito. O ordenamento jurídico inclui em suas letras o que pode ser observado em sua regularidade e repetição. Mas há algo que escapa às séries regulares: a política. Não podemos prever o resultado das relações de forças, mobilizações de opinião pública, vulneráveis aos acontecimentos aleatórios e modificáveis pelas constantes alterações na capacidade de luta dos envolvidos. E, justamente, o modo com que o Estado de Direito lida com o não regular é através de um cálculo de governo. Nesta lógica do governo, o estabelecimento da oposição entre o legal e o ilegal não é suficientemente sustentada. A governabilidade necessita realizar a conta do que é mais ou menos provável, compondo com as forças mais poderosas e fixando uma média considerada possível, além da qual quase nada será permitido. A política do possível cria um consenso que, de modo geral, bloqueia os restos resultantes do cálculo. Parece-nos esta a conta do Executivo ao nomear a Comissão Nacional da Verdade: ir até um ponto tal em que as forças aliadas não ameacem a governabilidade.
Constata-se, por outro lado, um movimento dissonante e que nos permite compreender além do possível previsto na governabilidade proposta pela política de memória do Estado. Este outro aspecto nos lança o olhar sobre os movimentos sociais, cuja mobilização apresenta uma pauta substancialmente diferente, ainda que com algumas confluências com a do Estado e da grande mídia. Estes movimentos concordam com o Estado na criação da Comissão da Verdade. Porém, se observarmos as ações de escracho aos torturadores e médicos legistas da ditadura, ou as manifestações públicas pela criação de lugares de memória, há uma questão conflituosa com a pauta do Estado: a punição dos responsáveis pelas graves violações de direitos humanos durante a ditadura.
Neste contexto, os restos do cálculo de governo são os movimentos sociais, sejam os de familiares e de vítimas diretas do período ditatorial, sejam os dos jovens, muitas vezes articulados com partidos e entidades representativas, em torno do escracho e da denúncia dos crimes. No cálculo da política do Estado os restos são computados, mas possuem um valor diferenciado, ora sendo importante para legitimar as ações propostas, mas, por outras vezes, especialmente na hora de decidir, são relegados ao segundo plano.
Contudo, se a política do possível tem o limite do acordo de governabilidade, para os movimentos sociais surge como pauta da Comissão a conquista dos atos de justiça e de transformação social e política do país. Digno de nota é que são os movimentos os defensores da aplicação da lei, em conflito com uma leitura favorável ao consenso imposto, como o fez o STF, ao fundamentar a impunidade em um “acordo” construído na ditadura.
Ainda que trabalhando dentro da lógica do legal e do ilegal (ou do justo e do injusto), a grande força dos movimentos em luta é seguramente o aspecto político, aquele que não pôde ser capturado pelas leis. O momento é de entrar no cálculo para propor outra conta na qual a posição dos familiares, dos grupos “tortura nunca mais” e dos novos movimentos de jovens pelo fim da impunidade não sejam considerados restos. Neste sentido, o discurso e a ação dos movimentos sociais podem problematizar questões fundamentais para um efetivo trabalho de apuração da verdade.
Em primeiro lugar, é preciso ter em conta os limites inscritos na própria constituição da Comissão, independente do mérito de seus membros. A Comissão Nacional da Verdade, como nos diz a lei, é uma instituição de governo, carente de autonomia estrutural de funcionamento e dependente do “suporte técnico, administrativo e financeiro” da Casa Civil (artigo 10º).
Soma-se a isto, para nos atermos aqui aos problemas relacionados à letra da lei, a “promoção da reconciliação nacional”. Nada mais anacrônico do que esta ideia. Passados cerca de 25 anos do fim da ditadura, qual seria o conflito a ser conciliado pelos trabalhos da Comissão? Ou será que os militares não se submeteram aos procedimentos legais e democráticos? Ora, se este ainda é um problema a ser reconciliado, é óbvio que a Comissão não poderá se ater aos direitos à memória e à verdade, mas deve ir além disto (que parece ser o possível nos cálculos de governo) e promover uma reforma das instituições, cujo regramento ainda encontra-se pleno da herança do período ditatorial.
Bom exemplo de uma ação política que ultrapassa os limites da apuração histórica é o movimento “Fórum Aberto pela Democratização da USP”, o qual propõe a criação de uma comissão da verdade na instituição visando, além do acesso à memória e à verdade, a reforma do Estatuto da USP, cujo regime disciplinar data de 1972 e está pleno de elementos autoritários.
Quem sabe os trabalhos da Comissão da Verdade não leve à conclusão pela reforma das relações entre civis e militares, da estrutura das Forças Armadas e das várias leis de caráter autoritário (por exemplo, a Lei de Segurança Nacional vigente, com certo verniz democrático, mas com última modificação datada ainda do fim da ditadura, em 1983).
Em segundo lugar, para um trabalho produtivo, é preciso a contribuição da sociedade aos questionamentos da Comissão. Isto é, um trabalho de busca da verdade organiza-se em torno de algumas perguntas. Desta forma, funcionaram as principais experiências de comissões da verdade no mundo. Na CONADEP (Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas, 1983), na Argentina, a questão era onde estavam os desaparecidos. Na Comissão de Reconciliação e Verdade (1996), na África do Sul, a pergunta central era sobre que país poderia surgir do processo de transição.
No Brasil, uma das questões a ser feita refere-se diretamente ao processo de elaboração e aprovação da Lei de Anistia de 1979. Alegam o STF e alguns outros que naquele ano ocorreu um grande acordo nacional em torno da anistia recíproca, válida para os perseguidos políticos da ditadura e, também para torturadores e assassinos. É salutar relembrar que na época, o Congresso Nacional era formado, em boa parte, por parlamentares “biônicos” (nomeados pela ditadura, sem a legitimação do voto popular). Poucos meses antes, vários políticos haviam sido cassados. Em 1977, o Congresso foi fechado e a lei eleitoral e de direitos políticos modificadas por decreto do presidente general de plantão. A censura vigorava, pessoas estavam desaparecidas ou banidas do país e a tortura era a política de governo para os opositores. Como pode, hoje, o STF declarar a legitimidade do acordo? Poderia a Comissão Nacional da Verdade apurar em que condições se encontrava o país e esclarecer ao STF e à sociedade a impossibilidade do acordo alegado, criando as condições para que reinterpretemos a Lei da Anistia sob a luz do esclarecimento histórico.
Outra pergunta que seria interessante a Comissão fazer é se há desaparecidos políticos no país. E não só do ponto de vista prático (ninguém melhor do que os movimentos de familiares sabem que os corpos de seus entes continuam sem sepultura). Mas do ponto de vista jurídico também. Recentemente, em decisão da Justiça Federal sobre o pedido de abertura de processo contra o coronel Sebastião Curió, pelos desaparecimentos de opositores no Araguaia, alegou-se a evidência de que eles já estão mortos e, inclusive, receberam atestado de óbito do Estado, a partir de 1995. Entretanto, estes atestados foram um ato administrativo visando permitir a continuidade da vida de familiares, e do ponto de vista civil. Não foram atos de justiça, muito menos suspensão do crime de sequestro continuado que configura a cena de um corpo desaparecido. Se a Comissão reconhece o crime em andamento no país, então a pergunta que se segue é: quem mantém, via ocultação de arquivos e informações, a condição destes brasileiros desaparecidos?
O atual processo de construção da Comissão Nacional da Verdade pode ser altamente positivo. Já tivemos alguns exemplos de comissões que ultrapassaram seus limites institucionais devido ao impacto político da verdade por elas apurada. Tivemos também outras em que o limite da lei foi a mordaça suficiente para que a memória reconstruída fosse a de que o crime de Estado pode permanecer impune. Sabemos que a lei que institui a Comissão não visa à punição dos responsáveis, mas não há nada nela que a impeça de apontar os fatos e seus autores. E mais: evidenciar aquilo que herdamos da ditadura e que a democracia naturalizou sob o manto dos acordos da política do possível.
Não nos parece revanchismo, como sugere o conselheiro recém-empossado Gilson Dipp, propor que se apliquem as leis do Estado de Direito e que os acordos e tratados do direito internacional sejam respeitados. Refiro-me à condenação do Estado brasileiro em foro interno, levado a cabo em 2006 pela juíza federal Solange Salgado. Sentença esta que, por falta de execução, levou à condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA.
Enfim, a discussão a ser pautada pelos movimentos sociais, não é exclusivamente sobre o mérito dos membros da Comissão Nacional da Verdade, mas sobre quais as perguntas que tal comissão fará em seu funcionamento e quais respostas ela dará aos anseios de uma democracia por vir."

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Desrazao de Estado: memoria e desmemoria


Uma cerimonia digna e equilibrada, na instalação, afinal, da Comissão da Verdade, cujo objetivo, tão simples e imprescindível no caminho democrático de qualquer Estado (ou Pais), e' a recuperação e a reparação dos males causados por seus agentes (funcionários ou servidores públicos), no exercício de suas funções, transgredindo direitos humanos reconhecidos pela comunidade internacional, em que se deseja inserir o Brasil, bem como recuperar os atos e as razoes de todos os que violaram direitos humanos, durante o período da ditadura, pós-golpe de 1964, ate a abertura política e a anistia estabelecida mais como compromisso do que como perdão.

Desejou-se fazer dela uma cerimonia de Estado, pelo que foram convidados ex-Presidentes, da era da abertura (o ex-Presidente Sarney,  escolhido -  não pelo voto popular, mas pelo Colégio Eleitoral estabelecido ainda no regime militar -, como modo de compromisso com tal regime, Vice-Presidente - depois assumindo a Presidência, em razão do falecimento de Tancredo Neves)  e  os eleitos pelo voto popular e universal, Fernando Collor, hoje Senador por Alagoas, que sofreu impeachment, Fernando Henrique e Lula da Silva.

Se ja' era significativa a eleição de um ex-Presidente, que foi condenado, em processo de impeachment, ao Senado, mais ainda o convite para a cerimonia.

O convite e a presença consagram, paradoxalmente, o esquecimento, que caracteriza a vida politico-social brasileira, coroando a iniciativa do outro ex-Presidente  -  hoje ainda na vida publica, e em cargo longe de ser irrelevante, de Senador e Presidente do Senado -  de retirar da historia do Senado (exposta, em simbolismo deveras marcante, em um túnel) o episodio do impeachment.

Isto tudo esta' a demonstrar que o impeachment foi, de fato, um acidente (como, alias, definiu-o o proprio Senador Sarney), na historia politica brasileira. Um acidente que nao gerou mudança imediata, que nao significou, de fato, a retomada das rédeas da política pelo povo. Povo que ainda nao se constituiu plenamente, em face do longo período de opressão e desigualdade, de desprezo pela educação e pela transformação social e cultural, que e' nossa historia predominante.

Ainda permanecem os compromissos com o passado de sujeição social, um pouco disfarçados por um ou outro ato de demagogia (de adulação bifronte: um pouco 'a opinião publica mal formada brasileira, um pouco aos tradicionais donos do poder): a covardia, que se disfarça, no dia a dia, em braveza, em dedo em riste (que ameaça os mais fracos e que adverte os adversários, para que se faca um pacto de não se incomodar, em protecção reciproca - não me incomode nos temas mais sensíveis e importantes, que eu também não o incomodarei; proteja-me no que e' relevante, que eu retribuirei do mesmo modo).

Um ou outro gesto: publicidade para todos (os servidores públicos do executivo federal), menos abertura de sigilo (CPI em curso) dos poderosos, sejam governadores de um e outro lado, sejam dirigentes de empresas, sejam contratos, sejam empresas poderosas ou úteis ou aliadas (de um e outro lado).

Mas, de forma geral, muitos anúncios, no futuro do indicativo, muitas vontades, no imperativo.

A recuperação da memoria das atrocidades contra a vida e a segurança da sociedade contrasta com o perdão concedido unilateral e despoticamente. Em nome de uma conciliação, uma transação cujos termos nunca são explicitados, nunca são revelados.

A lei de acesso 'a informação surge tardiamente, após criticas severas a uma tentativa de perpetuar o sigilo e o segredo (defendidos pelos próprios ex-Presdientes citados, alem de partidos que participam da coalizão governamental), mas sem meios, sempre como promessa, o futuro do indicativo, que sempre se transforma em futuro do pretérito, em nosso Pais.

A democracia, no Brasil, ainda esta' temperada pelo despotismo.

Ate' quando? Ate' que a memoria prevaleça sobre o esquecimento. Desafio para todos.

Não se foge da memória



Após a celebração, mãos 'a obra.

Um belo texto de Ignacio de Loyola Brandão: O passado vem nos buscar onde quer que a gente esteja.

quarta-feira, 9 de maio de 2012

domingo, 6 de maio de 2012

O poema mais curto em língua inglesa


Aqui, passagem do documentário sobre a luta de Ali, e o pedido dos estudantes de Harvard e a composição do brevissimo poema: "Me, we". Pois entao, what a man!

Me we.

O Adieu (Abschied) de Sarkozy


Nicholas se despede de Angela, na brincadeira do Frankfurter Allgemeine.

A serio, a Alemanha, para tristeza de Merkel, ja' da' como terminada a eleição e eleito Hollande.

Por que deveríamos acreditar em outro resultado?

Adieu, Sarkozy!

PERIGEU



 De quando em quando, se não é a literatura, a poesia, que nos oferece uma palavra para refletir, uma fonte nova de emoção e admiração, será a ciência. A ciência que está mais próxima, porque nos fascina, porque mais distante de nós. E isso será toda ciência, que fez questão de se afastar da comunidade dos humanos e se esqueceu deles. Quando retorna aos humanos, cobra por isso.

Perigeu (de perígeios,os,on 'que está em torno da terra', de peri- 'em torno de' e gê,ês 'terra'). Faz nos lembrar da Terra e do estranho estar "em torno de".   Não sabemos o que significa estar em torno de. peri.
Copernicanos ao contrário, copernicanos de ponta cabeça, achamos que tudo está em torno de nós mesmos. Vaidade, egoismo, egocentrismo. O mundo gira em torno de nos mesmos.
Quem cometeu esse equívoco, esse erro grosseiro, em primeiro lugar, foi um filósofo (escrevi sobre isso há muito tempo- na dissertação Sobre a Alteridade (1987), depois Recontrução do Direito (2003)), chamado Kant. Na Crítica da Razão Pura, ele chama a sua filosofia (pretensioso e egocêntrico) de "revolução copernicana", por unir ideal e real e fazer as categorias do sujeito desenharem as coisas, que giram em torno dele.
Ao contrário de Copérnico, que feriu o orgulho do pretensioso homem ocidental, que se formava, dizendo que seu mundo era apenas um mundo entre outros, que girava em torno de uma estrela, em torno de outro, que não si mesmo. E Copérnico era modesto, porque sua formulação (condenada pelo protestantismo, mas não pelo catolicismo) era apenas uma hipótese matemática, que so depois foi confirmada. Confirmada, em boa parte, por causa dos estudos de outro cientista, Galileu, este sim condenado pelo catolicismo.

E Perigeu diz apenas isso: algo gira em torno da Terra e maravilha os humanos, além de lhes impor a complexidade das marés. A única coisa que gira em torno dos humanos os domina: a mente, a imaginação, a poesia,e lhes determina a ciência. A tirania da Lua sobre a Terra e os Oceanos.

O contrário de Perigeu é Apogeu (apógeios,os,on, 'que é distante, afastado da Terra', de ap(ó)- e gáios ou geîos 'da terra', der. de 'terra'). Quando a Lua se afasta, alcança seu clímax.
Isto me lembra que, ao nos afastarmos de nós mesmos, alc ançamos também nosso apogeu, auge que vence egoismo, vaidade e nos faz sermos com os outros, girarmos em torno de, em vez de nos sentirmos circundados, amarrados.

O maior esportista do boxe de todos os tempos notabilizava-se exatamente por girar em torno de, e não por ficar parado no centro, sendo enredado. Saltava, permitia-se atingir pelos golpes do oponente, até cansá-lo e dar o golpe fatal, oferecendo-se aos gritos da platéia: "Ali, Ali"! "Ali bumaye"!



Compondo, de improviso, diante de estudantes que lhe pediam um poema, Ali gritou: "Me, we", o menor poema em lingua inglesa, que fala nao da dissolução de mim em nos, mas da união de todos nos, desde mim.

Ali, que fugiu de si, abandonando seu nome de batismo - na epoca assimilado 'a dominação - e assumiu um nome novo para si mesmo, tornando-se outro, perseguindo a outro, prosseguindo a fuga do mesmo.

E me flagro, uma vez mais, fugindo de mim mesmo, ao buscar tomar as rédeas de meu destino, que e' ser sempre outro, sem me fixar em nenhum ponto de parada, de paragem, de estabilidade e segurança. Buscando novas faces, novas facetas, novas esperanças.

Abandonando cada auge e antauge. Entre apogeu e perigeu. Num distanciamento cada vez maior do ponto inicial - que nao marca qualquer destino certo. Desenvolvimento, desenlace, desatinação, destinação...

Sempre em torno de, bailando peri, perigo, peregrinação. Acolhendo, dolorosamente, todos os golpes, todo sofrimento. 

Ate' o golpe final... knockout! Ali, Ali!

sexta-feira, 4 de maio de 2012

As cores cariocas e o cinza paulistano. Cronica sem pretensão.



A vantagem da alegria do carioca em relação ao paulista e ao paulistano vem das cores.
Compare: o time mais popular de SP e' o monotono preto e branco;  o carioca, rubro-negro. O tricolor paulista e'  o burocratico vermelho, preto e branco; o carioca, o empolgante verde, branco e grena'. Todos os times cariocas sao praianos, coloridos vibrantes, como os prazeres, os pecados e pecadilhos; o unico time praiano paulista chama-se santos. Seu concorrente, da epoca de ouro do futebol, também era branco e preto, como as imagens que guardam a magica de seus idolos Pele' e Garrincha, mas tinha como simbolo uma estrela e nao aquele escudo de barras, listradinho, lembrando uma prisao. Alem disso, era bota-fogo... A unica excecao na comparacao sao os times das colonias portuguesas. Em SP, o time e' colorido, no Rio, monotonia e ar de quem esta' sempre chegando 'as praias de caravelas, peito estufado, como a querer acabar com as alegrias selvagens aborigenes. Enfim, o time que faria a síntese de todas as colonias italianas, em SP, em vez de exuberancia de cores das regioes e cidades da peninsula, resume-se ao verde e branco. Em SP, os hinos parecem mesmo feitos para a parada militar; no Rio, Lamartine Babo compos as marchas-ranchos, com o coracao, cor do pavilhao de seu time do coracao, pelo qual torcer, torcer, torcer ate' morrer, morrer, morrer era um hino de alegria verdadeiro.
Falo sem preconceito, pois sou torcedor tricolor, aqui e no Rio. Fluminense como Nelson Rodrigues, que so' conto os gols de meus times nas partidas e ignoro os dos adversarios, assim como as pretensas vitorias deles...
Bom, nada como uma brincadeirinha, pra provocar meus conterrâneos, em dia cinza...
Por falar nisso, quem tera' levado o velho time de Pele' a se apresentar de pijama azulzinho nas partidas? So' pode ser coisa de patrocinador...